Bolsonaro sanciona pacote anticrime, mas veta 25 itens do texto


O presidente Jair Bolsonaro sancionou o o conjunto de medidas de combate ao crime, duas semanas depois de o Congresso ter provado o chamado pacote anticrime. O presidente vetou 25 itens do texto e manteve um que o ministro Sérgio Moro tinha criticado.
Jair Bolsonaro deixou no texto a criação da figura do juiz das garantias. Na prática, a lei exige que dois juízes atuem em cada processo: um no andamento da ação – cuidando de aprovar medidas cautelares, quebras de sigilo, homologar delações e outras iniciativas necessárias à investigação -, e outro para dar a sentença. Hoje, um só juiz cumpre os dois papéis.
Moro já vinha criticando a medida, que, segundo ele, vai trazer mais custos para a Justiça. Nesta quarta-feira (25), o ministro divulgou nota em que explicou porque era a favor do veto.
Ele disse que se posicionou pelo veto ao juiz de garantias, principalmente, porque não foi esclarecido como o instituto vai funcionar nas comarcas com apenas um juiz, 40% do total, e também se valeria para processos pendentes e para os tribunais superiores, além de outros problemas. Moro conclui comemorando a sanção. Afirmou que o texto final sancionado pelo presidente contém avanços para a legislação anticrime no país.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Fernando Mendes, também foi contra a criação do juiz de garantias e disse que não faz sentido ter juiz de garantias apenas nas capitais e para os crimes de colarinho branco. “Se o instituto é realmente importante, tem se ser aplicado para todos, seja nos processos da Lava Jato, seja nos processos de crimes comuns, que são milhares tramitando no interior do país e que precisam ter as mesmas garantias” e que “a Justiça Federal terá de redesenhar a sua estrutura e redefinir a competência penal para tornar possível a implementação do juiz de garantias”.
A Associação dos Magistrados manifestou preocupação quanto à sanção desse instituto, sobretudo em virtude dos custos relacionados à sua implementação e operacionalização. “A implementação do instituto ‘juiz de garantias’ depende da criação e provimento de mais cargos na magistratura, o que não pode ser feito em exíguos 30 dias, prazo da entrada em vigor da lei. A instituição do ‘juiz de garantias’ demanda o provimento de, ao menos, mais um cargo de magistrado para cada comarca”. A nota afirma que a AMB vai recorrer ao Supremo contra a lei.
Bolsonaro vetou outros 24 pontos do texto vindo do Congresso, entre eles, o aumento da pena para homicídios cometidos com arma de uso restrito. Não haverá também aumento da pena para crimes contra a honra, como calúnia, difamação e injúria cometidos pela internet. Pela proposta, a pena seria triplicada.
Foi vetada também a proposta que mudava as regras para a coleta de DNA. A medida ajuda a polícia na solução de crimes. Hoje, essa coleta é obrigatória para quem foi condenado por crimes hediondos e por crimes dolosos – com intenção – em que a vítima sofreu violência grave. Mas o texto aprovado pelo Congresso cita nominalmente crimes hediondos e ficaram de fora alguns, como genocídio ou porte ilegal de armas de fogo de uso restrito.
Ao vetar este ponto, a Presidência da República justificou dizendo que limitar a coleta somente para alguns crimes contraria o interesse público. Isso porque, segundo o Planalto, a redação do texto, como foi enviado, acabaria por excluir crimes hediondos de alto potencial ofensivo e cita como exemplos os crimes de genocídio e posse ou porte ilegal de armas de fogo de uso restrito. O governo, então, decidiu deixar a lei como está atualmente.
Foi vetada ainda a proposta que previa que gravações feitas sem o conhecimento do Ministério Público ou da polícia só poderiam ser utilizadas para a própria defesa. O ponto foi criticado por juristas e pelo próprio ministro Sérgio Moro.
Com o veto, fica valendo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que considera uma gravação feita pela própria pessoa como prova válida para acusação ou defesa.
Também foi vetada a possibilidade de captação por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno.
A nova legislação entra em vigor em 30 dias. As medidas vieram da comissão de juristas coordenada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal e também do pacote anticrime de Sérgio Moro.
Entre os principais pontos que passam a valer estão o aumento do tempo máximo de cumprimento de pena de prisão, que passou de 30 para 40 anos, para qualquer crime; a permanência de presos perigosos em presídios federais, que antes era de no máximo 360 dias e foi ampliada para três anos, renováveis por mais três; o fim da saída temporária da prisão para condenados por crime hediondo que resultou em morte; e delação premiada – a partir de agora, nenhuma medida cautelar e recebimento de denúncia ou queixa-crime poderá ser decretada ou apresentada apenas com as declarações do delator.
Veja o que foi sancionado de mais importante e o que muda na lei com o pacote em vigor.
LEGÍTIMA DEFESA
Como é: Quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Como ficou: Parte da proposta de Moro foi acatada. Legítima defesa foi estendida a agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém.
EXCLUDENTE DE ILICITUDE
Como é: Não há crime quando o agente pratica o fato por necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. O agente responderá pelo excesso doloso ou culposo.
Como ficou: Caiu durante a tramitação.
TEMPO MÁXIMO DE CUMPRIMENTO DE PENA
Como é: Pena máxima não pode superar 30 anos. Punições acima disso seriam unificadas para atender a esse limite.
O que Alexandre Moraes, ministro sob Michel Temer, queria: Amplia o tempo máximo de cumprimento da pena para 40 anos. Penas cujo somatório superasse isso seriam unificadas em 40 anos.
Como ficou: Entrou o texto de Moraes.
‘PLEA BARGAIN’
Como é: Não há previsão legal para esse tipo de acordo.
O que Moro queria: Acusado que assumisse antecipadamente a culpa pelo crime poderia receber em troca uma pena menor, quando a denúncia já foi aceita e o processo está em andamento
Como ficou: O grupo de trabalho rejeitou o texto de Moro.
NÃO PERSECUÇÃO PENAL
Como é: Não há previsão legal para esse tipo de acordo.
O que Moro queria: Investigado que assumisse antecipadamente não seria denunciado, em casos de crimes com pena de até quatro anos, com o objetivo de desafogar o judiciário.
O que Moraes queria: Acordo de não persecução penal, aplicado a infrações penais sem violência e com pena mínima de quatro anos.
Como ficou: O grupo de trabalho aprovou o texto de Moraes. Na sanção, Bolsonaro vetou que a não persecução possa ocorrer nos casos de crimes de improbidade administrativa
PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA
Como é: Não existe previsão legal, somente após o trânsito em julgado da sentença.
O que Moro queria: Antecipar a prisão após condenação em segunda instância.
Como ficou: Caiu. Uma PEC sobre o tema está em comissão especial na Câmara, e o Senado tenta aprovar alteração no Código de Processo Penal.
JUIZ DAS GARANTIAS
Como é: Não existe.
O que Moro queria: Não previu.
O que o Congresso queria: Deputados incluíram o juiz de garantias, que atua durante a fase de investigação do processo até o oferecimento da denúncia. Ele não julga. Ideia é evitar acusações de parcialidade.
Como ficou: Entrou o texto dos parlamentares —Bolsonaro não vetou o dispositivo, que vira lei
PENA PARA LÍDERES CRIMINOSOS
Como é:A lei aborda as penas a quem integrar organização criminosa
O que Moro queria: Propôs que líderes de facções começassem a cumprir pena em prisões de segurança máxima e proibiu progressão ao preso que ainda tivesse vínculo com a organização.
O que o Congresso queria: Grupo de trabalho retirou o veto à progressão, mas a Câmara devolveu e Senado manteve, com a ressalva de que a condenação deve ser expressamente por integrar organização criminosa.
Como ficou: Entrou o texto de Moro, com acréscimo da palavra “expressamente”.
SAÍDA TEMPORÁRIA
Como é: Lei prevê regras para preso ter benefício de saída temporária.
O que Moro queria: Não fez sugestão
O que o Congresso queria: Não terá direito à saída temporária o condenado que cumprir pena por praticar crime hediondo com resultado morte.
Como ficou: Foi aprovado o acréscimo feito pelos parlamentares.
BANCO NACIONAL DE PERFIL BALÍSTICO
Como é: Não existe na legislação atual.
O que Moro queria: Moro sugeriu a criação do banco para melhorar a investigação de crimes.
Como ficou: A proposta do ministro foi aprovada.
PERMANÊNCIA DE PRESOS PERIGOSOS
Como é: Preso pode passar até 360 dias em estabelecimento federal de segurança máxima, renovável quando solicitado pelo juízo de origem.
O que Moro queria: Ampliar a permanência para até três anos renováveis, quando solicitado pelo juízo de origem e se persistirem os motivos que a determinaram.
Como ficou: A proposta do ministro foi aprovada.
(As informações são dos jornais O Globo e Folha de São Paulo)