
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann ameaçou os deputados caso o decreto que recalibra o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e taxa aplicações, seja derrubado na votação desta segunda-feira (16), pela urgência de um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que pode sustar os efeitos da medida do governo.
O pedido de líderes da oposição e até mesmo de partidos que compõem a base governista, em autorizar que a votação entre na pauta do dia, foi atendido pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
“Sempre caberá ao Congresso 25% do contingenciamento, porque as emendas parlamentares são parte dos recursos discricionários. Eles [congressistas] já estão impactados com o corte que foi feito. O Congresso aprovou essas regras, então bate aqui e bate lá”, disse a ministra em entrevista publicada nesta segunda-feira (16).
O governo vai seguir negociando com os deputados, segundo a ministra Gleisi Hoffmann, que ainda afirma que o atrito com o Congresso pode ser atribuído à demora em liberar recursos das emendas parlamentares, alegando atraso na aprovação do Orçamento deste ano.
“Mas não tem como fazer milagre. Não houve, por parte do Executivo, nenhuma intenção de prender o Orçamento, de não liberar emendas, zero”, pontuou.
Ainda segundo a ministra, é injusta a reclamação sobre a recalibragem do IOF, pois apenas os rentistas serão tributados, sem afetar os setores que captam dinheiro deles.
“Não compreendo a gritaria sobre isso. Nós estamos falando de cobrar imposto de rentista. Hoje, nós temos, entre esses fundos, R$ 1,7 trilhão [em benefícios]. Por que não podem pagar um pouco de imposto? Não é o agricultor que vai pagar imposto”, completou.
“O rentista ganha dos 2 e não paga nada. O trabalhador médio, uma empregada, uma professora, pode pagar até 27,5% de Imposto de Renda. Então, é uma gritaria muito injusta”, continuou.
O setor do agronegócio foi um dos que expressou preocupação com a tributação e adiantou que vai para a “batalha”, segundo afirmou o presidente da bancada, Pedro Lupion (PP-PR).
Essa taxação, antes isenta de Imposto de Renda, se soma a outras medidas, como o aumento do tributo sobre as bets para 18%, o reajuste da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para instituições financeiras e fintechs, de 15% para 20%, o corte de 10% dos chamados gastos tributários, entre outros.
Aumento do IOF: veja o impacto
A alíquota do IOF foi unificada em 3,5% para todas as remessas e pagamentos no exterior, como compras em sites internacionais, saques em viagens, carregamento de cartões pré-pagos e serviços como Google Drive, iCloud e licenças de software.
Antes, essas alíquotas variavam entre 0,38% e 4,38%, e havia previsão de redução gradual até 2028. Agora, o governo reverte essa tendência.
Exemplos práticos:
Compra de R$ 1.000 em site internacional com cartão ? IOF de R$ 35
Pagamento de serviço de nuvem de R$ 500 via cartão ? IOF de R$ 17,50
Remessa de R$ 3.000 para familiar no exterior ? IOF de R$ 105
“Trata-se de uma mudança muito severa. Não apenas o setor de serviços, mas toda a indústria que consome serviços como jurídicos, serviços de computação em nuvem, entre outros”, afirma o especialista em tributação internacional Lisandro Vieira.
“Sabemos que hoje todas as empresas usam clouds, armazenamento em nuvem, e esses custos de tecnologia vão subir mais de 3% só no ato do pagamento do serviço internacional”.
Impacto sobre fretes e serviços internacionais
O aumento também afeta empresas que contratam serviços do exterior por remessa, como frete internacional — que entra no custo final de produtos importados. O imposto subiu de 0,38% para 3,5%, uma alta de quase 800%.
“Isso vai se aplicar, por exemplo, ao frete de mercadorias, porque se trata de um serviço. E hoje, quando uma empresa brasileira traz uma mercadoria, um bem do exterior, o frete é um dos maiores custos na composição do custo aduaneiro”, explica Vieira.
“Esse frete agora vai sofrer um incremento de mais de 3% na alíquota nominal e quase 800% na alíquota efetiva de imposto, então todos os produtos importados vão sofrer impacto no seu preço de alguma forma, o que vai pressionar a renda e o gasto das famílias, podendo até produzir efeitos sobre a inflação”.
Compras no varejo nacional também sentem reflexo
Mesmo nas compras feitas no Brasil, o aumento do IOF pode pesar no bolso — especialmente nas parcelas com cartão de crédito.
“O aumento do IOF afeta diretamente situações cotidianas de consumo, como as compras parceladas no cartão de crédito. No varejo esportivo, é comum o cliente dividir o valor de uma nova roupa, tênis ou equipamento”, explica CEO da Speedo Multisport, Roberto Jalonetsky.
“Com a alta do imposto, o valor final dessas parcelas sobe, mesmo sem o consumidor perceber de imediato. Isso reduz o fôlego para o consumo de produtos que não são de primeira necessidade, exigindo que as empresas sejam ainda mais criativas para manter a atratividade das vendas”.
Crédito para empresas mais caro
As empresas também passam a pagar mais IOF em empréstimos. A alíquota total subiu de 1,88% ao ano para até 3,95%. No Simples Nacional, vai de 0,88% para 1,95%.
Exemplo:
Empréstimo de R$ 10 mil por 1 ano
Antes: IOF de até R$ 188
Agora: IOF de até R$ 395
No Simples: de R$ 88 para R$ 195
“Quem precisa de crédito para manter o orçamento equilibrado ou financiar um bem essencial sente o impacto do IOF de forma imediata. Empréstimos, financiamentos e renegociações ficam mais caros e, com o aumento do IOF, esses custos podem aumentar consideravelmente, criando um obstáculo a mais para quem já enfrenta limitações financeiras”, diz o CEO da MA7 Negócios, André Matos.
“Do ponto de vista das empresas, o efeito é o mesmo: projetos são adiados, o caixa aperta e o apetite por expansão diminui. É um efeito dominó que prejudica tanto o consumo quanto o investimento”.
Previdência privada de alta renda passa a ser tributada
Aportes mensais de até R$ 50 mil em planos como o VGBL continuam isentos de IOF. Mas valores acima disso agora pagam 5% de imposto sobre o total aportado no mês.
Exemplo:
Aporte mensal de R$ 60 mil ? IOF de R$ 3.000
O que continua isento
Ficam fora das novas regras:
- Financiamento estudantil (FIES)
- Crédito rural e habitacional
- Programas sociais e investimentos em infraestrutura
- Compra de veículos por pessoas com deficiência e taxistas
- Transferências entre instituições financeiras
- Doações internacionais ambientais
- Fundos de aplicação no exterior
- Investimentos de pessoas físicas no exterior